Dificilmente
poderíamos falar em Judas Iscariotes sem o olhar acusador e repugnante de quem
observa ao longe o autor, inventor, criador da traição, do ato de covardemente
apunhalar, trair, vender seu amigo, mentor e protetor. Não nos é fácil imaginar
um plano maior, um objetivo mais amplo visando um resultado final
pré-estabelecido. Bondade, maldade, objeto?
Judas
Iscariotes foi escolhido como um dos 12 apóstolos
de Jesus Cristo, sendo apresentado, na listagem dos seus nomes, sempre em
último lugar (Mateus 10:2-4; Marcos 3:16-19; Lucas 6:13-16). Mais
tarde, ele tornou-se infiel e iníquo, conforme apresentado no Novo
Testamento. Era o encarregado da bolsa do dinheiro dos apóstolos: «tendo
a bolsa, tirava o que nela se lançava» (João 12:6). Teria
demonstrado exteriormente a sua fraqueza na cena da unção com óleo perfumado em Betânia, onde testemunhou que estava mais
apegado ao dinheiro do que propriamente aos gestos concretos com que Jesus
demonstrava a sua missão (João 12:1-6). Traiu seu
amigo e o abandonou em um momento importante, o deixando jogado às traças e ao
vício para todo o sempre. Após retirá-lo de um período de paz e comunhão
espiritual em todos os aspectos de vida, e jogá-lo em um mundo perdido.
Embora os
Evangelistas digam claramente que «Jesus sabia, desde o princípio, quem eram
os que não criam, e quem era o que o havia de entregar» (João 6:64) e tivesse sido,
de algum modo, aduzido e predito, caso se leia o Salmo 55 como uma referência
ao que viria a suceder com Jesus, que o traidor seria um "amigo
íntimo" - «Pois não era um inimigo que me afrontava; então eu o teria
suportado […] Mas eras tu, homem meu igual, meu guia e meu íntimo amigo» (Salmos 55:12-13) -, há
muitos que contestam se Judas estava ou não predestinado a ser o traidor.
Judas
entregou Jesus por 30 moedas de prata (Mateus 26:15 - Mateus 27:3). Esse era o
preço de um escravo (Êxodo 21:32). De acordo
com o autor do Evangelho de Mateus, os principais sacerdotes
decidiram não colocar essas moedas no tesouro do Templo de Jerusalém, mas, em vez disso
compraram um terreno no exterior da cidade para sepultar defuntos (Mateus 27:6-7). Segundo Zacarias, profeta do Antigo
Testamento, a vida e o ministério do prometido Messias
(ou Cristo)
seria avaliado em 30 moedas de prata (Zacarias 11:12-13). Isto
significava que, segundo a leitura dos acontecimentos feita pelo evangelista
Mateus, os líderes religiosos judaicos foram induzidos a avaliar a vida e ministério de Jesus de Nazaré
como dotada de bem pouco valor.
A
motivação da sua ação é justificada ou explicada, nos Evangelhos, de diferentes
modos. Assim, nos Evangelhos mais antigos, os de Mateus e de Marcos, tal
deveu-se à sua avareza
(Mateus 26:14-16; Marcos 14:10-11). Já nos
Evangelhos de Lucas e de João o seu procedimento é subordinado à influência
direta de Satanás
(Lucas 22:3; João 13:2-27) sobre as
suas ações.
Somos
filhos de uma nação historicamente cristã, então é perfeitamente normal essa
visão do bandido covarde e traiçoeiro que sem nenhuma razão compreensível traiu
quem o ajudou, protegeu, amparou e salvou. Em uma visão mais racional e lógica
(mas religiosa), ele seria apenas alguém usado para que Deus em sua infinita
sabedoria cumprisse seu objetivo que era salvar o homem do seu estado de
miséria. Se não houvesse o traidor, não aconteceria a morte do Cristo e sem
esse sangue remidor não haveria purificação, perdão, salvação. Olhando assim,
não se culpa muito Judas, pois o mesmo seria apenas um instrumento usado por
Deus para atingir um fim maior – a sua salvação -.
Cada um
decide sobre que ótica irá observar o passado e um dos principais
acontecimentos do cristianismo.
Pensando
nisso e guardando as devidas proporções, sem comparativos celestiais ou
salvadores, até porque não é possível traçar paralelos, fico aqui a matutar se
os Judas atuais estariam cumprindo um propósito “divino” ou apenas sendo
covardes traidores e mentirosos que venderam a alma, a decência, a honra em
troca das “moedas” atuais que já não são os dracmas ou os “mirreis” e sim promessas
mirabolantes que na grande maioria são impossíveis de serem cumpridas. 30
moedas... A tragédia que
seguiu-se a isso é bem conhecida.
Sou
favorável e defensor da liberdade. Liberdade expressa com atitudes verdadeiras,
sem subterfúgios. Declarar amizade e respeito a alguém e vendê-lo covardemente
não é atitude de seres livres e pensantes. Admiro e respeito meus adversários
declarados, aqueles que torcem pela sua bandeira, pelo seu time e o declaram de
forma digna e verdadeira. Não posso respeitar aqueles que vestem a camisa e
declaram amor a o time adversário com o único objetivo de angariar benefícios
próprios e isso é fazê-lo de forma escusa.
Aos
Judas modernos (que tenham sido usados por Deus ou por sua própria covardia),
meu pesar, uma vez que o mal por si próprio é destruído.
Valfran, enciclopédias e Bíblia